quarta-feira, 23 de fevereiro de 2022

Educação Inovadora em Mogi Guaçu: A Aventurosa Saga da Aprendizagem Significativa e as Falas de seus Heroicos Personagens

Andando pelo pátio de uma escola estadual de ensino médio, tenho a surpresa de observar que as portas dos banheiros feminino e masculino são identificados pelas marcas da Mulher Maravilha e do Super Homem. É o caso de rir por dentro! As imagens expressam anseios de adolescentes e jovens de tornarem-se mulheres e homens plenos, potentes e decisivos nas situações que enfrentarão.

O lugar é a Escola Luiz Martini, em Mogi Guaçu, São Paulo. Objetivo: conhecer a experiência de tutoria realizada simultaneamente ao ensino convencional, inspirada na experiência da Escola da Ponte e implantada com apoio e orientação do professor José Pacheco.

Sei que desde 2018 a unidade saiu de um estado física e psicologicamente precarizado, que chegara a registrar casos de violência e consumo de drogas por parte de alunos. Mas esse passado parece distante. É imediato perceber que instalações e relações pessoais demonstram vitalidade. Além da limpeza e da manutenção em dia, os espaços têm intervenções e contribuições dos estudantes. Arte nas paredes, horta coletiva, troca solidária, presença de voluntários, ex-alunos contribuindo com projetos culturais.

Concluo que a Luiz Martini está viva e potente.

A primeira etapa é conversar com os estudantes que participam da tutoria, e para isso faz-se uma roda de conversa. A diretora nos apresenta e explica que a adesão dos professores e estudantes à proposta de tutoria é opcional, e antes de deixar a sala coloca à vontade quem quiser participar para contar o que pensa a respeito.

São 15 desses tutorandos que se dispõem a participar da roda, conduzida em parceria com Helô Bueno, professora e voluntária na Luiz Martini e em outras escolas da região. Fazemos nossas apresentações. Somos ativistas da educação pública e da educação inovadora, e gostaríamos de saber as opiniões deles sobre a tutoria.



Mal começo a anotar o que dizem, observo a horizontalidade na comunicação. Os estudantes podem simplesmente se ausentar, mas se dispõem a compartilhar generosamente suas impressões. Expressam-se com clareza e combinam entre eles de quem é a vez. Interrupções, quando há, são causadas pela oportunidade e o entusiasmo e não pela vontade de aparecer ou prevalecer; e findam pela devolução da palavra ao interrompido.

Em sintonia com essas atitudes, grande parte dos relatos dos estudantes passa a mencionar a qualidade das relações estabelecidas com os tutores, as possibilidades da conversa individualizada, a atenção dada à situação de cada um.

Passo a anotar as falas dos estudantes:

- Na tutoria a gente se expressa melhor do que na sala de aula.

- O tutor acompanha cada um conforme sua evolução, enquanto na sala de aula o professor tem que dar atenção a todos ao mesmo tempo.

- O ensino “normal” atrapalha muito o interesse, já na tutoria se cria um vínculo pessoal com o tutor. 

As diferenças nas relações com o conhecimento aparecem de forma contundente.

- A gente não gostava da escola rígida anterior e depois da tutoria passamos a ter interesse em estudar.

- Inicialmente estava conectada a uma determinada perspectiva profissional, e meus projetos avançaram bastante; mas agora me sinto mais feliz e evoluindo ainda mais no aprendizado em outra área.

- Estou muito feliz com o que aprendi sobre derme e epiderme! Tem aplicações na estética, e envolve química, biologia, física das cores…

- Encontrei uma questão que envolvia matemática e fui pedir ajuda a um outro professor que não é tutor… Ele ficou surpreso com o que estou aprendendo…

- A tutoria permite perceber nossa evolução! Uma simples prova feita num dia não pode servir para avaliar um semestre inteiro de estudo, pois no dia da prova o aluno pode não estar bem… 

Sobre as condições da escola para oferecer a tutoria e a relação com o formato de aula surgem demandas e ressalvas. 

- A tutoria poderia ser à tarde? A mudança do horário da escola não foi totalmente favorável.

- Algumas vezes senti que o tutor não tinha disponibilidade, pois tinha outros afazeres. 

- Houve problemas mas a tutoria foi muito positiva.

- Alguns colegas parecem não se adaptar à ausência de aulas, não aproveitam a liberdade para se desenvolver…

- Outros professores poderiam se animar a se tornar tutores se conhecessem os resultados. Que tal se forem convidados a assistir às nossas apresentações? 

Ganhos significativos da experiência como tutorando são a valorização própria e o exercício da autonomia.

 - Incrível é a gente poder falar e ser ouvido…

- Na tutoria a gente se habitua a ser protagonista e assumir ganhos e perdas.

- Conversei com minha amiga numa ocasião que ela não estava tendo acesso ao tutor, e comecei a fazer as perguntas e questionamentos que ele faria! Quando percebi, estava sendo tutora também! 


Exemplo de como a liberdade cria possibilidades é a parceria entre duas amigas, com interesses distintos (em engenharia civil e em arquitetura), unidas num projeto comum para espaços subutilizados da escola. O resultado é uma planta em três dimensões consolidada em um vídeo que está em https://photos.app.goo.gl/KWSTon2yYa4hvAo49.

Mas no plano do valor pessoal uma frase sintetiza todas as demais:

- Antes eu pensava que precisava me formar pra ser alguém na vida. Com a tutoria pude compreender que eu já sou alguém na vida!


Em se tratando de estudantes do Ensino Médio, o assunto Enem não poderia faltar. A pressão pelo ingresso no ensino superior é percebida por todos, mas há uma consciência difusa de que os conhecimentos para “passar no Enem” estão num plano diferente dos adquiridos na experiência da tutoria, na qual são internalizados e vivenciados de forma única e intensa.

- Eu decidi sair da tutoria para me dedicar ao Enem.

- Creio que é possível compatibilizar Enem e tutoria, se a gente se organizar.

- O problema é que aprender somente para fazer Enem nos faz odiar a matéria… 

- O Enem está todo errado! Tem que mudar inteiramente! 


A frase do jovem a respeito do Enem sai de forma espontânea, numa conclusão lógica e ao mesmo tempo cheia de convicção, indignada e questionadora. Imediatamente me vêm à lembrança os símbolos dos heróis nas portas dos banheiros.

O tempo disponível se esvai rapidamente, mas essa ousadia da frase final permite ensaiar conclusões. Os alunos que passaram pela experiência da tutoria demonstraram evidências de aprendizados, conexão à realidade e desenvolvimento socioemocional. Ponto culminante para um educador, sentiram-se potentes para enunciar vontades tão diversas quanto transformadoras: reformar as relações na escola, mudar as aulas, repaginar espaços e, enfim, munidos de forças descomunais, rever o Enem - e a própria sociedade que o instituiu como marco na avaliação de aprendizagem.

A saga desses jovens está recém iniciada. Mas eles já sabem da existência de seus superpoderes, e apenas começaram a desenvolvê-los.



terça-feira, 15 de fevereiro de 2022

Visões do Futuro (hoje!)

Desde a primeira vez em que ouvi falar em inovações na educação, um vislumbre se repete: o de estar a presenciar algo que se tornará memória valiosa no futuro; o de fazer contato com uma realidade a que todos terão acesso um dia.

Confesso que não é totalmente confortável a sensação de antecipar devires. A prudência interna questiona: É pretensão? É desejo? Será o efeito da autocondescendência, que dá bons olhos para as causas que defendemos? 

Ao longo dos anos minha convicção aumentou: o dia da renovação maciça na educação chegará, e quando chegar me lembrarei das ocasiões em que encontrei pessoas capazes de insuflar essa certeza.



Neste dia 15 de fevereiro mais uma vez a sensação se repetiu; e me vi no futuro contando da satisfação de ter estado presente, face às consequências que terão ocorrido.

O local: Escola Aberta de São Paulo. Os personagens: José Pacheco, Edilene Morikawa, Marcelo Lopes, Luciano Araújo e muitos outros colaboradores, apoiadores e amigos. O evento: lançamento da Open Learning School no Brasil. A proposta: difundir valores, concepções e práticas da Escola Aberta de São Paulo junto a outros públicos e locais, mantendo o compromisso com a educação humanizada, democrática, diversa e inclusiva. Reafirmando a intenção de contribuir com a educação pública em favor de futuros melhores para todos.

Antes e depois do evento caminho por entre alunos da Escola Aberta de São Paulo, ora mobilizados em seus percursos de atividades, ora a aguardar os responsáveis que vêm buscá-las. Há nesse contato muitos aspectos a destacar, mas o que mais me atrai é a atitude das crianças. Muitas vêm conversar comigo, curiosas acerca de um novo personagem naquele espaço. Contam o que fizeram desde que entraram na Escola Aberta. Há entre elas nítidas demonstrações de respeito ao tempo de fala, às diferenças de opinião, aos respectivos tempos de aprendizado. A interlocução das crianças com colegas, tutores e visitantes não se ressente de qualquer ameaça ou medo.

João, com cerca de nove anos, carrega nas mãos um tablet em que apresenta um recurso matemático informatizado. Diz que ama estar na Escola Aberta porque aprende sempre mais. Pergunto a um grupo se são felizes ali, e a resposta é “sim!” em variados tons e intensidades. 

Minha impressão se renova. Daqui a muitos anos vou me recordar desse dia em que a educação do futuro já era realidade no presente e já podia inspirar novos passos.

domingo, 10 de outubro de 2021

José Pacheco e suas facetas

Alguns amigos que fiz em outros contextos admiram que eu tenha contato com o professor José Pacheco - e em seguida perguntam se “é aquele mesmo, famoso, da Escola da Ponte?”.



Diante da resposta afirmativa, parecem aumentar a apreciação que têm a meu respeito, sem saber que José Pacheco é a celebridade mais disponível de que se tem notícia. Ele se faz amigo de tantos quantos a tanto se disponham.

(Alguns se tornam célebres, e com isso se tornam inacessíveis. José Pacheco fez caminho inverso: tornou-se acessível, fez-se acessante, e é essa disponibilidade um dos ingredientes que o tornaram mundialmente conhecido.)

Vale repetir essa palavra: disponibilidade. Nos muitos encontros presenciais e virtuais que tive com José Pacheco, nunca vi recusar convite de quem queira sua visita, seu apoio, suas indicações, seus ensinamentos. Assim vai desfiando uma relação de nomes - pessoas, cidades, escolas, regiões, estados, distritos, freguesias, aos quais se refere com intimidade de confessor, “ligando o nome à pessoa, ao local, ao contexto” - e assim por diante.


Aliás eu mesmo fui alvo dessa generosidade: incumbido de recebê-lo no aeroporto e levá-lo a determinada cidade, perguntei se aceitaria falar em outro local que ficava no caminho… Assim logo se divulgou sua vinda e em breve não havia mais vagas. Depois de falar e ouvir durante duas horas partimos rumo ao destino, para enfrentar mais três horas de subida de serra! 


Suas falas são de duas naturezas: as que questionam, e as que respondem. Digo para mim mesmo que José Pacheco tem dupla personalidade, como Dr. Jekyll e Mr. Hyde: o revolucionário e o mentor.



Para questionar, o revolucionário José Pacheco é direto, por vezes incisivo, muitas vezes indignado. Ainda durante o questionamento se exalta - com os pactos de silêncio, com a apatia dos que sabem mas não praticam, com os que usam do poder para manter tudo como está, com os que temem o poder que não deseja mudanças.


Para questionar, esse personagem não economiza exemplos - dispõe de muitos! Também não teme repetir seus mantras:


Escolas são pessoas e pessoas são seus valores. Aulas não ensinam nada. Provas não provam nada. Separar crianças por idade é estupidez. Querer que todos aprendam ao mesmo tempo as mesmas coisas é burrice. Sem vínculo não há educação. Inovar na educação é compromisso ético. Temos amparo científico e legal. Escolas que não ensinam estão fora da lei. A escola não consegue ensinar e punida é a criança, não o professor.


E assim segue, desafiando os pilares de todos os absurdos que o autoritarismo a convenção, a repetição, a cristalização, a insensibilidade e o egoísmo mantêm para  imposição de um sistema ineficaz, excludente, repressor, medíocre e padronizador.


Depois que a braveza lhe altera a voz, Pacheco frequentemente torna a lembrar o que o revolta: estão matando o futuro das nossas crianças.


O outro lado de José Pacheco é o do mentor. Em contraste com o revolucionário, que fala para muitos, o mentor fala para uma única pessoa, mesmo que haja outras ouvindo. No momento em que alguém apresenta uma pergunta, Pacheco parece se ligar a uma valiosa perspectiva de realização. Tem nesses momentos uma notável demonstração de foco na pessoa que a ele se dirige. Não importa se poucos minutos antes se incomodou com alegadas impossibilidades, pois agora talvez tenha encontrado quem se disponha a superá-las.


Em contraste com a indignação do revolucionário, o mentor tem uma paciência que parece não ter fim, e uma atenção que se desdobra. Mesmo que o medo e a insegurança do perguntador-aprendiz se desdobrem como fractais, mesmo que antecipe obstáculos, mesmo que as dúvidas se repitam e pareçam prosaicas. E se, ao final dos exemplos, das fontes, das evidências empíricas, das indicações de experiências bem sucedidas, o perguntador permanece em dúvida, Pacheco saca da algibeira um estímulo final: “tu poderás fazê-lo, nós o ajudaremos”.



Portanto, e diante das oportunidades anteriores, sei que os encontros com Pacheco serão sempre acridoces.


Por um lado, haverá muito a questionar - imobilismo, conformismo, panaceias pedagógicas e tecnológicas, modismos acadêmicos; e suas causas - apego, medo, ganância, leniência.


Por outro lado, haverá sempre quem queira aprender - e isso suscitará o mentor José Pacheco, tornando o momento único e mágico, em que um educador observa, semeia e cultiva outros mundos.




terça-feira, 25 de maio de 2021

No lugar de apresentação, algumas das origens - 2 (*)

Há diversas formas de explicar meu percurso, mas a principal é a ludicidade, ou, como podemos denominar, a infância-que-nunca-acaba.


Passava as tardes brincando com os amigos na rua, até o grito de alguém me chamar pra jantar. Bola, patins, pião, taco, polícia-e-ladrão, eram os instrumentos para estar presente no mundo. Na calçada da rua, no terraço do apartamento ou no hall do edifício, com brinquedos e utensílios domésticos, fazíamos vastos mundos paralelos onde havia batalhas, investigações, viagens interplanetárias, lutas entre povos, passeios submarinos, descobertas científicas, caçadas, e todo o tipo de aventura.



Aprendi nesta fase da vida que brincar desperta uma energia interminável, somente interrompida, no mais das vezes, pela perda da liberdade.


“Crescer” ou “tornar-se adulto” requer de nós a negociação sobre como manter este enorme fluxo de energia, e ao mesmo tempo conseguir lidar com as exigências (e desejos...) da vida real.


Tornar-se adulto [saudável] vem do diálogo entre o prazer e as obrigações. Lembro com clareza dos esforços para trazer aos compromissos a imaginação, a criatividade, a liberdade compartilhada com os amigos, enfim, o prazer da infância.


No mundo adulto o “tenho que” substitui, afasta e quase elimina o “quero que” ou o “posso”.


Adestrados por padrões de comportamento, condicionados por mecanismos de aceitação e rejeição, reprimidos por valores impostos externamente, nos acostumamos a ficar desconectados do manancial de energia que flui na liberdade da brincadeira e do desejo. 


Entendemos que “tornar-se adulto” implica a perda da infância e a aceitação de formas previsíveis e socialmente aceitas de exercer a liberdade. Neste contexto, o caminho para a cura passa por descobrir, ou redescobrir, ou inventar, a alegria e a potência de estar no mundo. 


Meu caminho profissional não foi ligado à saúde, mas sim à educação. Cedo me surpreendeu a diferença entre o prazer da descoberta “livre” e o desconforto do conhecimento transmitido “à força” pela escola. O que já aprendera feliz em livros “de estórias” tornava-se na sala de aula peso a ser decorado dos livros de História. Por quê?


Pelo motivo mais simples. Desde que nascemos, e como qualquer ser vivo, separamos o que nos cerca em “contra” e “a favor”. A educação escolar é feita com o discurso da afirmação “isto é para o seu bem”, mas em sua grande maioria nada mais faz do que rejeitar o aprendiz, e tentar direcioná-lo para padrões pré-estabelecidos.


Uma educação e uma saúde mais legítimas são aquelas que partem do ponto de vista do aluno, ou do paciente. Eles são, ou devem se tornar, os verdadeiros sujeitos de suas histórias.


Nessa perspectiva, “Educação” não é o processo de formar, ou de conformar, indivíduos, mas sim, de libertá-los para a descoberta e a invenção dos seus desejos, talentos e caminhos. Este é o motivo pelo qual entendo que a busca e a manutenção da saúde requerem, desde sempre, conhecer, entender e respeitar o indivíduo, principal responsável e interessado em sua própria vida. 


Imaginação e ludicidade, criatividade e alegria se tornam, então, aliados indispensáveis para qualquer caminho. 


(*) Texto de minha apresentação como co-autor do livro “Conversa & Cura: desafiando e desfiando histórias” (Com Valéria Rôças, pela Editora Kiron, 2016).

Desenhos do autor, constantes do livro.


sexta-feira, 21 de maio de 2021

No lugar de apresentação, algumas das origens





A imagem é foto da capa de Reinações de Narizinho, com ilustração de Augustus - Augusto Mendes da Silva, de 1947.

Desde as origens, sou um privilegiado. Em minha casa havia, inteira, a obra de Monteiro Lobato destinada ao público infantil.

Ainda preservo o exemplar de Reinações de Narizinho, que puxa a fila da coleção, assinado por meu irmão, então com 8 anos.

Nossa mãe lia para nós dois na sala, antes de dormir.

Em vez de falar de Monteiro Lobato - o que fiz em outro espaço, para abordar o racismo em sua obra, e pode ser visto  aqui(*), quero falar dos ingredientes desse marco histórico para minha vida.

O primeiro elemento é a segurança: a sala de nossa casa, em que havia um sofá onde as leituras aconteciam. Teto, abrigo, alimento e conforto são seus ingredientes implícitos ou explícitos. Os capítulos eram lidos depois do jantar, e antes de dormirmos. 

O segundo elemento é o vínculo: nossa mãe lia para nós! Creio que não preciso explicar a importância disso. Meu pai não está nessa lembrança em particular, mas era sim corresponsável pela sala, o jantar, o sofá; e os quartos em que dormíamos.

Em resumo, éramos amados.

O terceiro elemento desta cena é o prazer simultâneo da escuta e da criação. Ao ouvir o relato, não só me encantava com a ideia - um besouro e um peixe conversam ao passear no rosto de uma menina, e ela escuta a conversa!  - como também criava  essa possibilidade em meu interior.

Segurança, vínculo, prazer, criatividade: estava pronto para todo o meu devir.

A descoberta do conhecimento e da imaginação por meio da leitura segue viva desde aquela primeira experiência fundamental, a partir da qual caminhei, por vezes só, por vezes acompanhado, buscando basicamente os mesmos elementos.


*Periódico dos Clãdestinos: http://jabuticiaspopulares.com.br, no número 9, coluna Corpo Oral.
A imagem é foto da capa de Reinações de Narizinho, com ilustração de Augustus - Augusto Mendes da Silva, de 1947.

domingo, 7 de março de 2021

À guisa de explicação

Prezados leitores, visitantes e passantes eventuais por esse blog:

Criei esse espaço para escrever sobre Educação, mas não o fiz por algum tempo. Agora retorno.

Preferi não apagar os escritos de 2017, com sua carga de dramaticidade e hermetismo, porque desejo resgatar a urgência que me acometeu naquele mês de maio.

De lá pra cá frequentei outros ambientes nos quais também lidei com a Educação, e pude conhecer outros tantos educadores. Aos poucos pretendo contar essas e outras experiências.

Opiniões, críticas e sugestões serão todas bem vindas.


domingo, 14 de maio de 2017

Caros leitores, perdoem o atraso

Minhas sinceras desculpas. Estou muito atrasado. Muito, mas muito atrasado mesmo. Afinal, faz mais de uma década. Na verdade há várias décadas estou alfabetizado, e até o fim da graduação já estava minimamente consciente do que se desenhava em torno ¬¬‒ e não era bom.

Sim, votei conscientemente, abracei boas causas, indignei-me quando me pareceu necessário, paguei impostos, respeitei leis e vizinhos, abracei carreira com finalidade social, mas sempre soube que isso era pouco. Pouco, insuficiente, escasso, etéreo, não porque eu tenha sido alienado ou tenha rejeitado a realidade. Pelo contrário, quando exposto aos sinais ruins, não afastei os olhos nem mudei de assunto: acompanhei atentamente, tentei entender, e conversei sobre eles com meu círculo de convivência.

Algumas vezes debati, outras confrontei, outras fui calado por argumentos melhores. Mas acompanhei, como muitos, de olhos abertos e atenção vigilante. Mas concentrei nas organizações (no trabalho) e instituições (nacionais) minhas expectativas... Implicitamente, autoencantadamente, depositei em pessoas mis¬ ¬‒ indistintas, idealizadas, delegadas ‒ minhas esperanças.

E tantas, mas tantas vezes, pensei escrever a todos os contemporâneos! Estes que presenciam os mesmos sinais, e que, provavelmente como eu, calam suas ansiedades. Precisava ter escrito, para saber de suas indignações, e de como veem soluções, e de como acompanham outros atores que conduzem nossos caminhos... Precisava ter escrito, para confrontar propostas, para discutir modelos, para apoiar pessoas e grupos em suas veredas. Para testar ideias, para receber críticas, para confluir, separar e voltar a unir.

Mas as linhas ideológicas não me atraíram o suficiente. Votei em algumas siglas com-e-apesar-de-seus-personagens, votei em alguns personagens com-e-apesar-de-suas-siglas, para nos intervalos lamentar delegações tão mal acompanhadas, mandatos escassamente transparentes, votações precariamente explicadas.